Fé Racional

"Em lugar da fé cega que anula a liberdade de pensar, ele diz: Não há fé inquebrantável senão aquela que pode olhar a razão face a face em todas as épocas da Humanidade. À fé é necessária uma base, e essa base é a inteligência perfeita daquilo que se deve crer; para crer não basta ver, é necessário, sobretudo, compreender. A fé cega não é mais deste século; ora, é precisamente o dogma da fé cega que faz hoje o maior número de incrédulos, porque ela quer se impor e exige a adição de uma das mais preciosas faculdades do homem: o raciocínio e o livre arbítrio." (O Evangelho Segundo o Espiritismo.)

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A Umbanda não é responsável pelos absurdos praticados em seu nome, assim como Jesus Cristo não é responsável pelos absurdos que foram e que são praticados em Seu nome e em nome de seu Evangelho. Caboclo Índio Tupinambá.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Sobre a Certeza



— Márcia você me desculpe lhe falar mais uma vez amiga, mas é que eu realmente penso que você deveria ir comigo lá no terreiro.

— Bobagem Vera, isto é coisa de ignorante!

— Ignorante amiga? Então quer dizer que você julga-me como tal?

— Não Vera! Apenas digo que as pessoas que fazem parte destes centros são ignorantes.

— Os médiuns?

— Exatamente!

— Mas lá na corrente do terreiro que eu freqüento como assistência existem médicos, professores, entre outros.

— Então, eles são doutos na profissão que exercem, mas ignorantes por acreditarem em contos de fadas.

— Desculpe pela insistência minha amiga, mas é que eu estou muito preocupada com esta sua tontura que nenhum dos médicos que você visitou encontrou explicação plausível.

— Eu sei Vera, eu sei!

— Então amiga, o que lhe custa dar uma chance para que as entidades que militam na Umbanda possam lhe auxiliar? Você não quer acabar com esta tontura?

— Puxa, já perdi as contas de quantas vezes você abordou este assunto comigo!!!

— Perdão! Eu não mais lhe aborrecerei!

— Não Vera, eu vou contigo! Está na hora de acabar com esta história de uma vez!

— Então você vai?

— Vou!

— Graças a Deus!

— Quando é a sessão?

— Hoje a noite, às 20;00 horas.

— Pode deixar que eu não faltarei.

Naquela sexta-feira à noite, precisamente às 20h45min, Márcia sentou-se em um toco para receber a consulta do Caboclo Rompe Mato que disse-lhe:

— Salve Tupã filha!

Ao que ela respondeu:

— Salve!

— Este Caboclo ignorante só gostaria de saber em que poderia auxiliá-la.

Márcia pensou: “será que esta entidade sabe o que eu penso a respeito desta seita?”

— Religião filha!

— Como?

— A Umbanda não é uma seita, é uma religião!

— Então você pode ler meus pensamentos?

— Posso ver somente aquilo que Tupã julgar que seja importante para auxiliá-la.

— Então por que você... Caboclo Rompe Mato, não é isso?

— Exatamente!

— Por que você não me diz o que vim fazer aqui nesta noite? Será que Deus permitiria que você visse?

— Já vi!

— Viu?

— Você pode até não saber, mas veio até aqui para acabar com uma certeza dentro de você!

— Acho que você não viu direito!

— Filha eu não devo tentar convencê-la de nada. Eu só posso dizer aquilo que a Lei me permita revelar.

— Mas de que certeza você está falando?

— Da mesma certeza que o vosso pai explicou-lhe aos cinco anos de idade!

— Meu falecido pai?

— Exatamente, lá no circo.

— Não me recordo.

— Filha você se lembra quando seu pai lhe explicou como é possível um animal robusto como o elefante ficar preso em um pequenino toco de madeira?

Os olhos de Márcia marejaram com as recordações do pai saudoso e ela respondeu ao Caboclo:

— Lembro.

— Então, o seu pai lhe explicou que o elefante desde pequenino tem uma corda amarrada em seu corpo que o prende a um fortíssimo tronco de árvore, não foi?

— Exatamente!

— E como o elefante tenta inúmeras vezes se libertar daquela corda e não consegue um dia ele acaba desistindo de tentar fazer isto justamente por ter a certeza de que isto seria impossível.

— Meu Deus, mas como o senhor pode saber disto?

— Filha não precisa chamar-me de senhor, continue a tratar-me de você.

— Acho impressionante como o senhor pode saber de uma coisa tão antiga, entretanto devo lhe dizer que se enganou quanto ao motivo que me trouxe até aqui esta noite.

— Verdade filha?

— Sim. Vim até aqui por que estou com uma tontura terrível.

— A tontura é conseqüência e a certeza é a causa dela!

— Como é?

— Uma certeza que você possui está provocando esta tontura.

— É incrível como o senhor consegue ver tão bem o meu passado, mas não enxerga o momento presente!

— Fale mais filha!

— Na verdade o meu esposo vem cobrando certa coisa há seis anos e eu tenho um medo muito grande de “quebrar a cara” com a decisão que eu tomar. Eu tenho medo e não certeza!

— Você não está indecisa pelo medo, mas devido à certeza!

— Certeza?

— É! Certeza de que vai “quebrar a cara” se concordar com o seu marido.

— E qual é a diferença?

— Aquele que tem medo procura se precaver e se preparar para depois escolher um caminho. Após a escolha ele até teme pelo pior, mas não tem receios de viver um dia após o outro. Já aquele que tem a certeza de que vai “quebrar a cara” acabará “quebrando-a” por que será incapaz de enxergar o aprendizado da caminhada em sua decisão.

— Nisto você tem razão.

— Você entende que é a certeza que a vem impedindo de agir tal qual um pequenino tronco de madeira que consegue prender o mais potente elefante?

Neste instante, ao misturar imagens do presente com recordações do seu saudoso pai, Márcia chorou um copioso pranto.

O Caboclo Rompe Mato deixou que a tempestade passasse e somente quando chegou a bonança emotiva no coração de Márcia foi que ele disse:

— Toda escolha envolve perdas e ganhos: o importante é saber o que se quer perder e o que se deseja ganhar com uma determinada escolha.

— Você sabe de qual escolha eu estou falando, não sabe?

— Você, até sentar na frente deste Caboclo, tinha a certeza de que engravidar iria acabar com a paz em sua vida. Agora, depois da conversa que estamos tendo, esta certeza já não está tão clara em seu coração.

— É verdade!!! Mas...

— Fale filha!

— Qual é a relação desta certeza com a tontura que venho sentindo?

— Filha, esta gravidez foi programa no plano espiritual antes de seu reencarne e este Caboclo só pode dizer que é uma oportunidade que você vem esperando há muitas encarnações.

— É mesmo?

— Sim. E o seu espírito sabendo que a hora é chegada vem lhe fazendo recordar do compromisso assumido há tanto tempo.

— E isto vem causando a tontura?

— Não. A sua teimosia em não querer assumir o compromisso vem atraindo companhias espirituais indesejadas e grande desequilíbrio energético para você.

— Nossa, Caboclo Rompe Mato, eu não entendo muito do que você está falando, mas sinto a força da verdade em suas palavras dentro do meu coração!

— Que bom filha, pois este Caboclo só pode lhe dizer o que Tupã permite que seja dito.

— Eu entendo!

— Reflita no que Caboclo lhe disse e use o seu livre-arbítrio com sabedoria! Peça a Deus que lhe dê entendimento para discernir verdadeiramente o que é ganhar e o que é perder de acordo com as decisões que você tomar, entende?

— Sim senhor, mas...

— Solta língua seu filha!

— Será que o sonho que tenho desde criança, mas que vem se repetindo intensamente nos últimos seis meses, está relacionado com este meu compromisso pré-reencarnatório?

— Filha este Caboclo, no momento, só está autorizado a lhe dizer que assim que o seu filho nascer este sonho não mais se repetirá.

— Sim senhor, obrigada por tudo!

— Não agradeça a este Caboclo, agradeça a Tupã.

Dois anos depois deste atendimento Márcia senta-se com o seu filho na frente do Caboclo Rompe Mato e lhe diz:

— Senhor Caboclo eu vim aqui hoje por dois motivos, sendo que o primeiro é lhe agradecer pela vida do meu filho, Henrique.

— O Caboclo cruzou a testa da criança, olhou para Márcia e disse sorrindo:

— O seu curumim é lindo, mas Caboclo lembra de ter pedido a você que só agradecesse a Tupã, não é verdade?

— É verdade!

— Mas diga filha Márcia: qual foi o outro motivo que trouxe você para conversar com este Caboclo?

— É que eu tenho uma dúvida que para esclarecê-la eu teria que lhe contar aquele sonho que eu tinha desde criança e que, como o senhor mesmo me disse, parou de ocorrer desde o nascimento do Henrique.

— Pode falar filha!

— É que em meu sonho eu me via como esposa de um governante de um dos povos do antigo império babilônico. Eu via também que estava grávida, mas que o filho não era do meu esposo e sim de um escravo de nossa residência que tinha o nome de Josias.

Caboclo Rompe Mato recordava junto com Márcia quando lhe disse:

— Prossiga filha!

— Bom daí, de uma forma que eu não sei dizer como, o meu marido descobriu este fato e chicoteou...

O Caboclo Rompe Mato prosseguiu:

... chicoteou o escravo até matá-lo.

— Isto! Mas o que mais me impressiona foram as palavras ditas pelo escravo antes de morrer e que foram:... O Caboclo Rompe Mato prosseguiu:

— “...............não se preocupe , pois um dia eu a auxiliarei a trazer a criança de volta a vida”.

— Isto! Mas, como o senhor sabe?

— Continue a contar o sonho filha!

— Naquele momento eu não entendi o porquê do escravo haver dito aquelas palavras a mim; somente dois dias depois do seu óbito foi que descobri: meu marido obrigou-me a escolher entre ter a criança e ser vendida como escrava ou abortar e continuar como a amante dele. Visando apenas o meu conforto eu tive a certeza de que era melhor abortar, mas o meu marido, mesmo assim, vendeu-me como escrava, do resto não me lembro.

— E qual é a sua dúvida filha?

— É que o meu bebê, o Henrique aqui no meu colo, eu sinto como se ele fosse aquele escravo reencarnado, eu estou certa?

— Isto é coisa que Caboclo Rompe Mato não está autorizado a dizer só o seu próprio coração.

— Então está bem, agradeço a Deus por tudo, mas também não tem como deixar de agradecê-lo!

E, com um esboço de sorriso no canto dos lábios, o Caboclo disse a ela:

— Agradeça somente a Tupã filha! Este Caboclo é só um espírito ignorante!

Márcia sorriu ao recordar-se do quanto era pedante e preconceituosa com as práticas umbandistas há dois anos até o momento que conversou pela primeira vez com o Caboclo Rompe Mato.

O Caboclo despediu-se de Márcia e ela bateu ritualisticamente a cabeça no gongá em reverência e agradecimento a Deus.

A cambone do Caboclo Rompe Mato olhou para ele de forma quase suplicante ao solicitar:

— Posso falar com o senhor?

— Pode falar filha!

— É que eu gostaria muito de agradecer o aprendizado que obtive com o senhor neste atendimento: muitas vezes deixamos de agir, de optar, de escolher nem tanto por medo, mas pela certeza de que o caminho que escolhermos nos levará ao arrependimento. Jamais devemos agir com o intuito de errar, mas se errarmos devemos entender que isto só nos aproxima do jeito correto de se fazer as coisas.

— Caboclo está vendo que filha aprendeu mesmo, hein?

— Muitas vezes deixamos de agir não por medo de errar, mas pela prepotência de querermos sempre ser infalíveis e pela triste certeza de que é melhor não agir do que errarmos.

— Caboclo fica feliz com seu aprendizado, mas agradeça somente a Tupã por ele.

— Sabe senhor Caboclo foi incrível, quase inacreditável, como o senhor sabia descrever com minúcias o multissecular sonho da Márcia.

— Multissecular?

— É por que, como o senhor sabe, o império babilônico existiu há muitos séculos.

— Entenda, filha cambone, que você não deveria se espantar com este Caboclo por isto!

— Ah eu sei que não deveria mesmo, pois eu sei como o senhor é poderoso e..........

— ...............Filha cambone?

— Sim senhor Caboclo?

— Nunca mais repita que este Caboclo é poderoso!!!

— Desculpe!

— Este Caboclo sabe que você exerce há pouco tempo a tarefa de cambonar, mas nunca se esqueça que só Tupã é poderoso aliás, Todo Poderoso!

— Sim senhor!

— Não precisa ficar assustada, porque Caboclo não está brigando, mas tentando esclarecer você.

— Sim senhor!

— Caboclo sabia do sonho da filha Márcia não porque é poderoso, a justificativa é muito, mas muito mais simples!

— E o senhor poderia contar qual é?

— É que este Caboclo é contemporâneo da época em que ocorreu a história contada pela filha Márcia e é por isso que tem conhecimento do sonho narrado por ela, entendeu?

— Sim senhor!

— Então, por caridade, vá chamar a próxima assistência para este Caboclo atender por que a prática da caridade não pode parar, não é filha?

— É sim senhor! Deixa eu ir lá chamar a assistência!

E enquanto a cambone se afastava do Caboclo ele agradecia intimamente a Deus pela oportunidade de ter auxiliado na tarefa que há muito aguardava.

A cambone trazia uma senhora de aproximadamente sessenta e cinco anos de idade que seria o próximo atendimento da entidade e, enquanto isto acontecia, o Caboclo Rompe Mato passou a recordar dos tempos em que fora líder religioso de um povo que posteriormente foi feito escravo pelos caldeus. Na religião que ele professava eram ensinadas as verdades sobre a reencarnação, mas também a existência em um único Deus. Lembrou-se de que era casado e que, quando o seu povo foi feito escravo, o governante maior dos caldeus tomou a sua mulher para amante, sem saber que ela estava grávida do esposo há poucas semanas.

A entidade se recordava destes momentos referentes a esta encarnação com um profundo sentimento de respeito e gratidão ao Divino Criador pelo fato de tanto haver evoluído por meio do sofrimento, e, enquanto a próxima pessoa a ser assistida pela entidade sorria para ele e já se sentava no toco o Caboclo Rompe Mato terminava de agradecer a Deus por todo o crescimento espiritual que adquirira quando fora a encarnação do escravo caldeu que possuía, nesta referida época, o nome de Josias.

Fonte: http://pedrorangelsa.blogspot.com/

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